A recente sanção da Lei 15.040/2024, conhecida como o Marco Legal dos Seguros, representa uma transformação no setor segurador brasileiro, modernizando um campo legislativo que, até então, dependia majoritariamente das disposições do Código Civil de 2002. A nova legislação consolida regras específicas para contratos de seguro de forma mais ampla, traz maior transparência às relações contratuais e busca equilibrar as relações entre segurados e seguradoras. Além de prometer mais segurança jurídica, o marco é visto como um catalisador para o crescimento do setor, que atualmente responde por cerca de 6% do PIB e pode atingir até 10% até 2030, segundo o Deputado Reginaldo Lopes, relator do projeto na Câmara dos Deputados.

Entre as inovações trazidas pela nova lei, um dos destaques diz respeito à regulação e liquidação de sinistros, um processo crucial que, pela primeira vez, recebe atenção no ordenamento jurídico brasileiro.

O processo de regulação e liquidação de sinistros

A regulação de sinistro, consiste em um conjunto de procedimentos realizados pela seguradora na ocorrência de um sinistro para apuração de suas causas, circunstâncias e valores envolvidos, com vistas à caracterização do risco ocorrido e seu enquadramento no seguro. Por sua vez, sinistro é a ocorrência do risco coberto, durante o período de vigência do seguro.

A regulação de sinistros, descrita na Lei 15.040/2024, além de regras ao longo da lei, está regida especificamente nos artigos 75 a 88. A nova legislação especifica ainda a liquidação, que compreende o cálculo e o pagamento das indenizações, caso devidas. Essa divisão objetiva evitar confusões conceituais, tratando-se de um avanço importante frente à ausência de regulamentação no Código Civil de 2002.

Mais transparência e prazos definidos

Uma das mudanças está na obrigatoriedade de as seguradoras concluírem a regulação de sinistros dentro de 30 dias, contados a partir da data da reclamação ou do aviso do sinistro. Nos casos de sinistros complexos, esse prazo pode ser estendido para até 120 dias, o que dependerá de norma regulatória da autoridade fiscalizadora.

Caso reconhecida a cobertura, a seguradora terá o prazo de 30 dias para pagar a indenização. No entanto, o marco legal trouxe outra inovação: a exigência de adiantamentos proporcionais durante a regulação, medida que assegura maior agilidade financeira ao segurado, especialmente em situações emergenciais. Esse adiantamento parcial pode se dar no decorrer da regulação, desde que os valores sejam suficientes e completamente estabelecidos pelo regulador, conforme mencionou Fabio Ulhoa Coelho durante as discussões sobre o tema no PL 29/2017, quando em tramitação na Câmara dos Deputados.

Tal adiantamento vem ao encontro com a ideia de realizar a regulação e a liquidação de forma simultânea, na busca de agilizar o processo e garantir que o segurado receba a indenização de forma mais célere. No entanto, a lei menciona a possibilidade de regulação e liquidação simultânea "sempre que possível", indicando que essa simultaneidade não é uma regra absoluta, podendo haver exceções dependendo da complexidade do caso.

Deveres de transparência e cooperação

A Lei 15.040/2024 exige que, em caso de negativa de cobertura, as seguradoras forneçam cópias de todos os documentos utilizados durante a regulação do sinistro, porém, a seguradora não fica obrigada a entregar documentos considerados confidenciais ou sigilosos. Além disso, qualquer negativa de cobertura deve ser acompanhada de uma justificativa fundamentada, como já é atualmente, no entanto, a nova lei deixa claro que o motivo da negativa não pode ser alterado em juízo posteriormente, salvo forem descobertos fatos novos que possam impactar diretamente nos motivos da negativa. Segundo relatório do projeto de lei que deu origem ao Marco Legal dos Seguros, essas medidas buscam proteger os segurados contra negativas sem o devido fundamento.

Por outro lado, o segurado também tem obrigações claras na sua relação com a seguradora, como informar o sinistro "tão logo saiba", tomar providências para minimizar os danos e prestar todas as informações de que disponha sobre o sinistro.

Falando em deveres, a lei também deixou expressa a responsabilidade do regulador e do liquidante, que devem exercer suas atividades com probidade e celeridade, manter os interessados informados e empregar profissionais especializados, quando necessário.

Conclusão

A Lei 15.040/2024 marca uma nova era no setor de seguros no Brasil. Ao trazer em seu corpo a regulação e liquidação de sinistros, a legislação também traz desafios operacionais para as seguradoras e demais envolvidos neste procedimento, pois ainda haverá necessidade de normativos regulatórios para sua completa estruturação, implemento de novas tecnologias e uma nova dinâmica na apuração do sinistro.

Se implementado de forma eficaz, o Marco Legal dos Seguros tem potencial para se tornar um divisor de águas na relação entre segurados e seguradoras, promovendo um ambiente ainda mais eficiente para todos.


Texto por:
Marco Yamada - Gerente Jurídico
marcoyamada@mandaliti.com.br