É sabido que o recorrente tem o direito de desistir do recurso manejado a qualquer momento, inclusive sem anuência das demais partes do processo, conforme preceitua o artigo 998 do Código de Processo Civil. Contudo, o atual Codex limitou a desistência ao estipular, no parágrafo segundo do mesmo dispositivo, que tal renúncia não impedirá a análise de questão cuja repercussão geral já tenha sido reconhecida e daquela objeto de julgamento de recursos extraordinários ou especiais repetitivos.

Parece claro que o intento do atual Código de Processo Civil foi evitar a manipulação da jurisprudência, dificultando que a parte recorrente impeça a produção de precedente desfavorável. No mais, corroborou o atual Código a Constituição Federal, a qual delegou ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal o papel de julgar causas cujas quais servirão de referência para todas as instâncias ordinárias.

Diante disto, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial Nº. 1.721.705 – SP, sob relatoria da Ministra Nancy Andrighi, afastou a desistência solicitada pela requerida Amil Assistência Médica Internacional S.A., no qual guerreava-se a obrigação do plano de saúde custear tratamento de câncer com medicação off label, o que é vedado por algumas seguradoras.

Nas palavras da Ministra Relatora, “verificada a existência de relevante interesse público, pode o Relator, mediante decisão fundamenta, promover o julgamento do recurso especial para possibilitar a apreciação da respectiva questão de direito, sem prejuízo de, ao final, conforme o caso, considerar prejudicada a sua aplicação À hipótese específica dos autos”. Preceituou, ainda, que“o interesse coletivo que envolve a controvérsia é incontestável, sobretudo em virtude do expressivo número de beneficiários de planos de saúde que encontram suas pretensões, no mais das vezes, restringidas significativamente por Resoluções Normativas da ANS sem fundamento na legislação federal infraconstitucional”.

Salientamos, no entanto, que a despeito da extrema relevância do mérito da causa, o presente informativo fica ligado à questão da desistência do recurso por parte da recorrente quando constatado interesse coletivo relevante que justifique o julgamento pelo Tribunal Superior.

Certo é que o Código de Processo Civil no parágrafo único do artigo 998, atribuiu aos tribunais superiores o julgamento de “teses”. Diante disto, temos que, havendo desistência do recurso pela parte, a “causa” em si que seria levada a julgamento pelo tribunal superior não existe mais, de modo que o papel da corte será o de decidir sobre tese, unificando a interpretação de determinado tema, praticamente legislando, o que seria contra a própria Constituição Federal.

Não obstante, certo é afirmar que antes do atual Código de Processo Civil a desistência de recursos extremos não era aceita pelo Superior Tribunal de Justiça quando de recursos já afetados sob o fundamento de interesse público, conforme julgamento do Recurso Especial n.º 1.063.343-RS. Contudo, conforme entendimento anterior, as partes ainda ficavam vinculadas ao processo, diferente de hoje em dia.

Enfim, diante do novo diploma processual e da jurisprudência criada, certo é que ainda haverá muito debate sobre o tema, cujo acompanhamento será constante para aquilatar a posição sacramentada pela Corte Superior.

Rodolfo Rabito Soares 
seguros@mandaliti.com.br